quinta-feira, 6 de maio de 2010

Tolices, tolices

O maior problema de quem escreve é querer contar uma verdade. A vontade de ser lido e acreditado faz com que o escritor minta desvairadamente. Ser dono de uma frase de efeito, metafórica, possivelmente eterna e aplicável em toda humanidade há de ser uma bela mentira para que possa virar uma verdade aderida e adorada. Então, esclareço a vós que me lêem neste momento, que minto. Da primeira letra que escrevi lá em cima até a última que escreverei lá em baixo. Tudo mentira.

Isso posto de lado, posso confessar que acredito em paixões platônicas. Não só acredito como aplico no meu cotidiano. Adoro adorar uma desconhecida. Uma vizinha que se vê de relance, uma adolescente comprando cigarro escondido numa banca, as universitárias que enchem a cara, falam besteiras, dançam na mesa e não estão nem aí. Eu tenho uma paixão louca por aquelas que mal olham pra mim. Sou um apaixonado incontrolável. Uma vez sentei-me ao lado de uma moça no ônibus quando retornava do centro em direção ao flamengo. Não devo ter ficado mais que oito minutos ao seu lado. Talvez até menos levando em consideração o tempo que eu demorei para passar na roleta e o tempo de sair do ônibus. Fiquei cinco minutos ao lado dela. Bastou um olhar, um “boa noite” e um livro que ela segurava do Oscar Wilde para conquistar meu fascínio.

Ah! As pessoas não entendem que as paixões devem ser platônicas. Olhar, imaginar, planejar uma aproximação em grande estilo, como um Marlon Brando... Aí que reina o romance! O frio na barriga, aquele velho, batido, relembrado desde a antiguidade. Ele não vem de sorvetes de domingos perdidos em um aniversário de cinco anos de namoro. O frio vem no momento que precede o sim ou o não. No momento que precede e que perdura o primeiro e o segundo beijo. Esse frio está no momento em que se perde de vista aquela pessoa que se estava trocando olhares, sendo que, também os olhares davam aquele frio.

As pessoas acham que paixão é ter ataque de ciúme, que posse é prova de amor. Posse é prova de impotência. A posse prova a insegurança. Ela é o medo de estar sozinho, medo de não se querido de verdade. A posse é para quem não sabe amar. Posse é para forçar o amor do outro. O amor deve ser amado. Uma das formulas da felicidade é deixar um amor livre e vê-lo voltar para amar de volta, mas sempre deixando voar.

O amor espontâneo é espontâneo porque é amor. Se não for espontâneo, não é amor e pronto. Pode ser outro tipo de afeto, mas amor, amor... Não. A espontaneidade de um amor está na vontade de ver um sorriso de surpresa, um pulo de alegria, uma lágrima de emoção. Não está em simples manutenção. Na obrigação da renovação.

A cada casal que vejo na rua de mãos dadas e olhares vagos, sinto uma tristeza... Vejo a frieza da comodidade. Não acredito na comodidade. Acredito na intensidade! Acredito em Vinicius de Morais. Acredito na chama! Que haja sofrimento entre cada alegria. Mas que haja alegria. A alegria é energia de renovação. O mundo seria melhor se as pessoas pudessem mudar mais. Que fosse normal mudar de time, de nacionalidade, de casa, de amizades. É preciso! Renovar é viver.

As paixões devem ser platônicas. Cada entrega deve ser inteira. É um absurdo se privar do mundo. É preciso não negar o desejo de estar com outras pessoas. Cada pessoa é uma experiência, experiências não são desafetos. As pessoas precisam ser descobertas! Quantas pessoas interessantes não fizeram despertar uma emoção? A alma diz sim, o corpo diz sim, mas a mente diz não... francamente!

Peço também que isso não seja lido com um manifesto pela galhinhagem. A vida vai além de quantas gozadas, quantas minas e quantos caras. A pessoa é mais do que um órgão genital. É mais que uma boca. Sem contar com as inúmeras doenças que você pode pegar na vadiagem. Prezo pelo interesse pessoal. Prezo por um bom diálogo e dos carinhos feitos com o tato. Nós somos tão mais do que gênero, preferência sexual, e estética... Tão mais!

Eu já perdi a conta de quantas mulheres me cativam a curiosidade. Coisa de conversas rápidas em pequenas festas sociais na casa de alguém... Aquela que faz pintura, a que faz cinema, a que não sabe o que vai fazer, a que odeia o mundo, a que quer salvar o mundo... São ideologias, histórias, famílias... É um mundo em cada pessoa. É o charme que cada alma traz para expressão dos olhos, para a entonação da voz... A pessoa é o conjunto. Como é possível só se interessar por uma pessoa? O mundo é um mundo de pessoas que valem a pena.

Quando paro para conversar com alguém que me atrai, normalmente me inundo de emoções. Posso até gaguejar. Estou defronte com o resultado da história do universo. Somos o resultado de bilhões de anos resumidos em gestos, olhares, respirações... Como não se entregar a uma paixão nessa condição? Principalmente se ela também gosta de Café Paris, acha muito engraçado aquele filme do Woody Allen e ao mesmo tempo ama a saga do Rocky e do American Pie... Ou até outras coisas... Em cada pessoa, uma graça.

Como não sentir saudades?! Como?! Saudades são tão intensas e tão verdadeiras! Morrer de saudade... É possível. A saudade é física. A saudade encobre e comprime o coração. Ela alfineta uma respiração mais profunda. Ela pesa ou eleva o passo. A Saudade é aquela vontade de rever ao mesmo tempo em que às vezes é a vontade de esquecer. A saudade é aquela bebida que se você beber aos poucos não enjoa, não tem ressaca e não se embebeda. Mas se você exagerar, não tenha dúvida que será uma tortura. Pois a Saudade também é fruto da falta, da ausência, da vontade de algo que não está lá. E para esse tipo de saudade tenha “uma bebida por perto, porque você pode estar certo que vai chorar”.

Antes sentir saudade de alguma coisa qualquer do que não sentir saudade de nada.

Então, assim, desta maneira, termino minhas mentiras e minhas frases de efeito vindas desse banho de ilusão que me banha e que está pronta para banhar de mentiras quem mais quiser acreditar nesses absurdos.

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